segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Sem deixar a peteca cair


Depoimento de uma ex-aluna que se formou em uma das primeiras turmas do CEAM. No tempo da direção de Henriette Amado.



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 Carmen uma economista, botafoguense e portelense.

Colégio Estadual André Maurois, que saudade!

Fui aluna do André, como carinhosamente chamavamos o Colégio Estadual André Maurois. Fui da primeira turma formada pela Escola. Assim como quase todos que ali passaram, na época de Henriette Amado, agradeço o tempo que estudei no André ... Primeiro Colégio Estadual da zona sul do Rio de Janeiro, com primeiro e segundo grau, chamados na época de ginásio e científico ou clássico, o André foi entregue nas mãos de Henriette Amado, até hoje eu não sei bem os motivos. O jeito de educar de Henriette seguramente não era a maneira como a ditadura esperava que os estudantes fossem educados naquela época. Partidária da liberdade com responsabilidades, Henriette transformou o André num local aberto, com discussões a todo momento sobre todos os assuntos, ampla liberdade de circular no prédio que não tinha bedéis nos corredores. Trouxe pra compor o corpo docente, o que de melhor o Estado tinha entre os seus quadros: Maria Helena Silveira, Clovis Dotori, Anny Dutra, Fernando Bomilcar, Sarah Castro Barbosa, Marisa Campos da Paz, Emir Amed, Ronald Mano, Duilio (matemática), Circe Navarro, Cema (química), Nei (descritiva), Mano (matemática) ajudaram Henriette a implantar um ensino de qualidade com liberdade dentro da escola, integrando parte da equipe docente que implantou com Henriette Amado o projeto pedagógico do André. Foram responsáveis pela formação de várias turmas de alunos da minha geração que, hoje, espalhados pelo mundo agradecem por terem aprendido a valorizar o conhecimento e a liberdade com responsabilidade.
Fomos formados pela escola pública de qualidade e isto marcou muitas das opções da maioria de nós.
Algumas décadas depois de ter saído do André, já na vida profissional, fui chamada por antigos colegas para participar de uma homenagem ao Colégio ... temerosa pelo que iria encontrar hesitei. O ensino público havia se deteriorado no país e seria muito doloroso me defrontar com um Colégio destruido, sem um projeto político pedagógico que se assemelhasse ao que pude usufruir.
Mas, acabei cedendo e num dia de chuva voltei aquele prédio que eu conhecia tão bem ...
Entrei pelo portão do pátio lateral e já me espantei. Ao invés de um local sujo, o pátio estava simplesmente molhado com alguns folhas caídas pelo vento ... notava-se que estava limpo ... engraçado, a cantina tinha saído do lugar e agora estava no canto oposto. Mas, o Nelson ainda estava por lá ... um forte abraço uniu nossas lembranças e me deu coragem para continuar entrando ...
Mal sabia eu o que iria encontrar ... as paredes caiadas de branco eram as mesmas da minha época, sempre limpas ... nos murais avisos novos sinalizavam que a escola continuava cuidada.
Procurei a antiga sala da Henriette e tinha saido do lugar.. a diretora Giorgina Carlin tinha a sala no lado oposto, mas a porta continuava aberta ... entrei, me identifiquei e falei da alegria que sentia em retornar a Escola e encontrar tudo arrumado e cuidado. Giorgina fez questão de me mostrar as salas de aula do 2º e 3º andar. Carteiras inteiras, vidros no lugar, professores em sala, alunos assistindo aula, xerox funcionando, tudo na mais perfeita ordem ... naquele momento, a emoção ja tinha tomado conta de mim e as lágrimas de alegria corriam soltas ... como era bom perceber que havia qualidade no André ... comentei com ela como isso era importante. Soube então que faltavam orientadores, coordenadores, bibliotecários etc e que apesar da excelente estrutura fisica, havia uma enorme carência de recursos humanos pra tocar o projeto pedagógico, que a evasão escolar era alta e que os grandes problemas enfrentados pela Escola, naquele momento, eram a desestruturação familiar e a crise de valores da sociedade.
Entendi as dificuldades que a Prof. Giorgina colocava. Mas, mesmo assim reconheci que o esforço em manter a escola com cara acolhedora e dinâmica, seguramente não devia ser pequeno ... recebi como resposta: sou discipula de Henriette Amado e não podia deixar a peteca cair ....
Hoje, ainda muito atônita com o que aconteceu numa escola publica de Realengo, lembrei dessa visita feita há alguns anos .... e, por ter tido o privilégio de ter sido aluna do André na época de Henriette Amado, pensei comigo mesma: Giorgina, você tem razão, sou fruto de um projeto pedagógico orientado pela Henriette Amado, também não posso deixar a peteca cair ... também sou responsavel por defender o ensino público de qualidade, única alternativa para construir um Brasil melhor ....

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